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sábado, 29 de abril de 2017

Uma postagem sobre a greve geral de 28/04/17

(Por: Clara Ferrer*)

Hoje, ao acordar depois do primeiro dia de filmagem do meu novo filminho, finalmente tive a oportunidade me informar e pensar sobre tudo o que aconteceu nas ruas ontem enquanto estávamos imersos na nossa pequena bolha cinematográfica. Como sempre, o que mais me pegou foram os habituais comentários de que "os baderneiros tiverem o que mereciam", de que "protesto tem que ser pacífico, senão é vandalismo", de que "manifestação impede o direito de ir e vir".

Sabe, é engraçado. Quando gente a gente vê filme sobre uma judia explodindo um cinema cheio de nazistas, um grupo de carismáticos pobretões armando um grande plano para assaltar bancos ou camponeses invadindo o castelo de algum rei tirano, a gente não tem dificuldade em entender quem é o herói e quem é o vilão, quem nos representa e com quem devemos e QUEREMOS nos identificar, e os motivos pelos quais a violência e o desrespeito às leis, vindo dos oprimidos contra os opressores, são não apenas justificáveis, aceitáveis e legítimos, mas também talvez até necessários e desejáveis.

Claro, cinema não é vida. Mas é dela que ele tira todo o seu material - a Revolução Francesa, a resistência contra o nazismo, a luta diária do homem pequeno contra as grandes corporações, todos esses eventos são coisas muito reais, e quando pensamos nelas, na sua narrativa e em quem é quem nessas histórias, mais uma vez, acho que não é difícil identificar quem gostaríamos de apoiar e os motivos que justificam a violência nas ações dessas pessoas. Não é difícil perceber que, em certas situações, a violência é necessária, sim. Porque protesto e revolução pacífica podem até ocorrer, de fato, em contextos muito particulares e específicos. Mas na maioria das vezes a mudança só vem da interrupção da ordem, do incômodo profundo, da ameaça ao status quo. Só que, para que isso aconteça, é preciso que essas ações ocorram em larga escala. É preciso apoio popular. É preciso que todo mundo vá pras ruas e lute junto. Então é claro que, quando as pessoas começam a ir para as ruas, a primeira coisa que quem está no poder faz é buscar um jeito de cortar o apoio popular, tornar os protestos tão anêmicos e pouco efetivos quanto possível, tornar a própria luta impossível. Quando você aceita esse discurso de que manifestação popular só pode ser pacífica, e o resto é baderna e vandalismo, você está fazendo justamente o que o poder vigente quer. Você está retirando o seu apoio da sua própria luta.

Com seu discurso, você está apoiando outro tipo de violência: a violência dos grandes bancos que ficam bilionários enquanto endividam o trabalhador e sonegam impostos em quantias que poderiam salvar estados inteiros. A violência dos manda-chuvas do transporte público, que enriquecem de maneira inimaginável enquanto a gente precisa gastar um quarto de cada dia e metade do nosso salário só pra sair de casa e voltar. A violência de governantes que, afundados em privilégios inconcebíveis, cortam com a consciência limpa os nossos tão suados salários, férias, aposentadorias, empregos, escolas e hospitais. A violência da força policial e militar que, armada com o monopólio da violência conferido pelo Estado e com um aparato bélico adquirido através dos nossos próprios impostos, chuta e bate e mata e quebra e acusa e mente e prende e ataca quem bem entende. 

É a esse lado que você está se aliando quando nega a legitimidade de se rebelar, da maneira que for necessária, contra essas violências. Quando você une sua voz ao coro da massa de manobra doutrinada pelos grandes meios de comunicação que querem restringir o máximo possível nossas possibilidades de luta. Não se engane. Você está mais próximo do mendigo, do ladrão de dos"protestantes baderneiros" do que da polícia, dos bancos, dos jornais e das instituições que defende de maneira tão irrefletida e encarniçada.

Melhore.



(*Clara Ferrer é escritora e estudante de Cinema. Este seu texto foi postado sem título na rede social Facebook em 29/04/17)

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