Recessão, falências, crise. Embora muito
tenha se escutado essas palavras nos últimos dois anos, a grande
maioria das pessoas sequer sabe como a grande crise financeira, que
afligiu o mundo todo em 2008 e ainda deixa marcas, realmente começou. A
quem ela atingiu realmente? Como aconteceu? Quem esteve por trás do
maior crash monetário da história e – o mais importante – o que aconteceu com essas pessoas?
Trabalho Interno,
documentário produzido, escrito e dirigido por Charles Ferguson vem
para lançar uma luz sobre este tema tão controverso através de
entrevistas, cópias de documentos, gravações de importantes momentos da
história americana e relatos que dissecam a Grande Crise, uma catástrofe econômica que, ironica e comprovadamente, poderia ter sido evitada.
Narrado por Matt Damon, o filme explana a
trajetória da crise em cinco partes (ou tópicos), que mostram desde as
primeiras formações do cenário (através de algumas leis fiscais
aprovadas pelo congresso americano, pressionado por poderosos lobbies
corporativos, ainda nos anos 80), passando pelos avisos de economistas
do mundo todo em artigos e livros que já previam o desastre econômico
desde o começo do milênio, até chegar na venda das subprimes e das CDOs,
e no estouro da famigerada “bolha” imobiliária e suas conseqüências
(tanto para grandes empresas, bancos e governos, quanto para o
trabalhador comum ao redor do mundo), e – além – os mecanismos usados
para (tentar) contornar a situação e o saldo geral disso tudo (em um
último tópico singelamente chamado de “onde estamos agora?”).
Além de gráficos, exemplos e algumas
metáforas usadas para explicar a maior parte dos termos técnicos
(ampliando o alcance da obra para os mais leigos nos assuntos
econômicos), o documentário utiliza-se de uma gama de entrevistas de
pessoas extremamente gabaritadas para contar, em primeira mão, suas
impressões e seus papéis na Grande Crise. Alguns desses entrevistados,
inclusive, foram pivôs do problema, e acabam encurralados com as
perguntas perpetradas por Ferguson (em certo momento, um deles pergunta
se dá para desligar a câmera por alguns instantes).
Com uma rica edição de imagens que nos
faz viajar da Islândia ao Canadá, dos Estados Unidos a uma fábrica na
China, o diretor nos dá a clara noção de como os efeitos da crise se
propagaram a nível mundial, ilustrando também a discrepância do cidadão
médio que perdeu tudo (através das inúmeras imagens de casas
desabitadas, empresas se fechando e acampamentos montados ) e da fortuna
ainda mantida pelos CEOs responsáveis pelo incidente (exibindo suas
intocadas mansões luxuosas, jatos particulares e outros bens que valem
milhões e milhões de dólares), que – pasmem – ainda ocupam cargos de
destaque na Administração Obama.
Embora menos engenhoso que Lixo Extraordinário e não tão contundente quanto Restrepo, dá para perceber (e concordar) o porquê de Trabalho Interno ter ganho o Oscar 2011 de Melhor Longa Documentário (segunda indicação de Charles Ferguson, que concorreu ao Oscar 2008 com o documentário No End In Sight,
que abordou a ocupação americana no Iraque). Além de ser um filme muito
bem feito e com excelente produção (não é qualquer um que reúne alguns
dos homens mais influentes da economia mundial para uma conversa
franca), aborda um tema crucial para todos e – mesmo que para nós
brasileiros não pareça tanto – ainda atual.
P.S.1: Longe de me equiparar aos
economistas e autoridades citados no 3º parágrafo, mas meu 1º trabalho
de Teoria Geral da Administração, em abril de 2007, já previa um colapso
financeiro em escala mundial para o final da década. =P
P.S.2: A quem interessar possa, há quase dois anos escrevi um texto no meu blog explicando, de forma bem simples (não tão completa quanto em Trabalho Interno, é claro), como a crise começou. Para ler, basta clicar aqui.
Título: TRABALHO INTERNO (Inside Job)
Direção: Charles Ferguson
Elenco: Matt Damon (narração), Daniel Alpert (ele mesmo), Jonathan Alpert (ele mesmo), Sigridur Benediktsdottir (a própria), Willem Buiter (ele mesmo), John Campbell (ele mesmo), Chrstine Lagarde (a própria), Dominique Strauss-Kahn (ele mesmo);
Duração: 120 min.
Gênero: Documentário
Ano: 2010
Em 2008, uma crise econômica de proporções globais fez com que milhões
de pessoas perdessem suas casas e empregos. Ao todo, foram gastos mais
de US$ 20 trilhões para combater a situação. Através de uma extensa
pesquisa e entrevistas com pessoas ligadas ao mundo financeiro,
políticos e jornalistas, é desvendado o relacionamento corrosivo que
envolveu representantes da política, da justiça e do mundo acadêmico.
12/06/2011
WJ SOLHA
Resenha do filme Trabalho Interno. Confira!
CAPITÃO VASCO MOSCOSO
O HOMEM QUE “REDUZIU O TSUNAMI DA ECONOMIA, EM 2008, A UMA SIMPLES MAROLA.”
W. J. SOLHA
O HOMEM QUE “REDUZIU O TSUNAMI DA ECONOMIA, EM 2008, A UMA SIMPLES MAROLA.”
W. J. SOLHA
Acabo de assistir ao “Trabalho Interno” (Inside Job), Oscar de Melhor
Documentário deste ano. Apesar de achar que o tema seria melhor abordado
por Michael Moore (de Farenheit 11 de Setembro) – que lhe tiraria o ar
de tese – a eficiência de Charles Ferguson é evidente na exposição do
que foi a recente crise econômica mundial, a maior desde a Depressão da
década de 30, e que começou com a quebra do banco americano Lehman
Brothers, seguida de gigantescos desmantelos numa série de outros, com
perdas globais estimadas em cerca de US$ 20 trilhões (R$ 33,2 trilhões),
em vista da enorme quantidade de falências, também, noutros setores,
principalmente o imobiliário, numa onda assustadora de desemprego.
Buscando clareza em matéria bastante complexa, Ferguson abre o filme
com este letreiro em fundo negro: “Eis como as coisas realmente
aconteceram”, dividindo seu trabalho, a seguir, em cinco partes – feito
um clássico grego ou shakespeariano – “Como Chegamos Lá”, “A Bolha”, “A
Crise”, “A Prestação de Contas” e “Onde Estamos”. Como numa abertura de
ópera, mostra, inicialmente, um país pequeno mas quase perfeito – a
Islândia – sendo expulso para leste do Éden, arruinado pela privatização
dos bancos e desregulamentação de suas atividades, tudo obtido com
eficiência por lobistas e o convencimento feito por prestigiados
economistas de Columbia e Harvard, regiamente pagos pelos banqueiros,
por baixo do pano.
Nos Estados Unidos, essa desregulamentação fora obtida já no governo
Reagan, que colocara no arquivo morto a rígida lei que controlava os
bancos de investimento. Com isso escancarou-se o crédito, principalmente
para o setor imobiliário, criaram-se fortunas em cima de papeis –
nomeadamente de seguradoras -, a maioria das vezes em operações de
imenso risco, donde pipocaram inevitáveis fraudes contábeis, até que a
bolha, em 2008, estourou.
Ferguson é contundente nas entrevistas e depoimentos que consegue dos
principais envolvidos, mostrando-nos economistas que ficam sem
respostas, vacilam, recusam-se a dizer qualquer outra coisa mais, a
partir do instante em que se veem acuados. É chocante ver um desses
grandes nomes dizendo que não via problema em receber grandes boladas
dos bancos por prestar “serviços de consultoria” ao Governo Federal, no
que é interrompido pelo cineasta:
- O que acha de um médico que receita um remédio não exatamente indicado
para um paciente... por ter para isso recebido propina de um
laboratório?
O diretor não deixa republicanos nem democratas de fora: Reagan, Bush
pai, Bush filho, Clinton e Barack Obama, todo mundo dança. Obama,
aliás, nomeou como seus assessores quase todos os envolvidos no desastre
financeiro da América e do mundo, no governo anterior, gente que não só
jogara tantas famílias na miséria, como criara uma farra permanente ,
paralela, de executivos e operadores financeiros mergulhados na droga e
em prostituição de larga escala, enquanto a corrupção seguia em frente,
à altura da impunidade sem limites.
Caramba, Obama ganhou o Nobel da Paz ao incrementar a guerra! Como se pode crer num semelhante sistema?
Mas por que o título deste texto – “Capitão Vasco Moscoso” – com Lula
posando de homem da Marinha, se o filme nem menciona o Brasil,
geralmente considerado extraordinária exceção na bancarrota geral?
Porque ele me lembra muito o personagem de Jorge Amado que se faz
passar por marítimo, em “Os Velhos Marinheiros”, e se mete numa fria ao
ter que comandar um navio a encostar no porto de Periperi. Alguém
da tripulação, ao ver que ele não entende nada do ramo, pergunta-lhe
quantas amarras devem prender a embarcação ao cais, ao que o “Capitão”,
sem saber o que responder, chuta: “Todas!”, e se torna alvo de gozação
geral quando se espalha que há um navio todo emaranhado no porto, até
que – homem de uma sorte sem igual – vem uma tempestade nunca vista, à
noite, e a nau por ele capitaneada é a única que fica inteira em
Periperi. Por que digo isso? Porque é evidente o motivo pelo qual nenhum
banco, no Brasil, sequer balançou com a crise: todo mundo sabe que aqui
os juros ( como os impostos ) são os mais altos do mundo. Aqui – por
essas e outras - é o paraíso dos banqueiros, com total cobertura do PT.
Como falir, com lucros nunca dantes navegados?
- “Esse é o cara!”, disse Barack, referindo-se a ele.
Ferguson deveria ter incluído essa patranha no documentário. Daria a ele um toque de malícia e humor.
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